O Céu de Ícaro

Porque o céu de Ícaro tem mais poesia que o de Galileu

Resolução de ano novo



Todo fim de ano é igual: pessoas fazendo promessas para o ano novo que com certeza não vão cumprir, outras reclamando que o ano passou rápido. Enfim, o mesmo papo de sempre.
Este ano de 2013 decidi fazer algo diferente. Resolvi que iria escrever um texto original para cada dia do ano. Obviamente que não vou escrever um conto por dia, porque isso seria desumano. Sim, algumas pessoas me veem escrevendo coisas eventualmente, coisas que geralmente vão parar no lixo e nunca veem a luz do dia. É penoso escrever um conto quando isso vira uma obrigação. O conto que venho postando em capítulos, por exemplo, o La Vie En Rose, eu comecei a escrever a mais ou menos um ano. Depois de um ano inteiro engavetado, resolvi escrever o segundo capítulo.
Quando comecei o primeiro capítulo, eu não fazia ideia de como o conto terminaria. Na verdade, eu sabia apenas o que iria acontecer até o terceiro capítulo, talvez por isso não continuei a estória na época. Há alguns dias eu finalmente parei, fiz aquele prazeroso exercício mental de se por na pele de outra pessoa e tentar contar sua história, e finalmente consegui terminar o conto. Não que ele já esteja escrito, mas pelo menos eu sei que rumo tomar.
Confesso que, ao terminar o segundo capítulo, percebi que ele era meio vazio de conteúdo, mas foi muito bom para mim escrever aquilo, pois pude reviver lembranças e transferir aquilo para o personagem. Prometo que o terceiro capítulo será excelente.
Enfim, vou deixar esse making of para outro post, pois não vim aqui falar disso.
Quero anunciar que à partir do primeiro dia de 2013 (também chamado de amanhã), postarei um poema por dia neste blog. Sim. Um poema por dia.
Não espere que eu escreva um Lusíadas por dia, não, às vezes serão apenas quadras, ou poemas curtos, mas serão 365 contados.
Serei honesto, e de antemão digo que não escreverei um por dia, mas, como eu disse, postarei um por dia. Pode ser que em determinado dia eu não consiga escrever, e em outros eu escreva bastante, então deixarei alguns prontos para serem postados no dia determinado.
Nesse meio tempo, também escreverei outras coisas, e se você quiser enviar algum texto, música ou desenho, fique à vontade.

Bom, essa é minha resolução para o ano novo. E você? O que você se desafiará a fazer para deixar seu ano mais interessante?

La Vie En Rose (Capítulo 2)



Veja aqui o capítulo 1

Guardiã



Decidi seguir o conselho de alguns amigos e fazer uma viagem. A Europa me parecia uma boa escolha, afinal, sempre quis conhecer algumas cidades icônicas como Paris, Londres, Veneza... Sabia que se eu visitasse essas cidades e continuasse nesse estado depressivo em que me encontrava, era porque meu caso não tinha cura.
            Montar meu roteiro de viagem foi terapêutico. Por algum tempo esqueci todos meus problemas e comecei a ficar empolgado com a viagem. Essa ideia de férias, afinal, estava me ajudando a superar a dor.
            Depois de vinte dias desde que havia começado a me programar e uma longa viagem, eu finalmente chegava ao Charles de Gaulle.
            O ar do aeroporto já parecia fazer meu coração bater mais acelerado, ou talvez fosse apenas emoção. Eu já estava a tanto tempo em depressão que havia me esquecido de como era ter sentimentos bons trazidos à tona.
            Apenas deixei minhas coisas no hotel e resolvi que, apesar do clichê, a torre Eiffel seria o primeiro lugar eu iria visitar.
            Fui até a estação de metro mais próxima do hotel, já que utilizar o transporte público seria a melhor forma de interagir com os parisienses e observas seus costumes. De fato, isso vale para qualquer lugar.
            Confesso que me senti um pouco idiota quando, ao parar o trem, fiquei alguns segundos esperando que a porta se abrisse e um francês apressado me empurrou e apertou o botão que abria a porta. Eu não sabia que em Paris, você deveria abrir a porta do metrô, seja por meio de um botão ou uma maçaneta. Foi neste momento que percebi eu, por mais que você pesquise sobre um lugar, ainda existem pequenas coisas que você só descobre estando lá, e essa é a beleza de viajar. Essas pequenas coisas me distraiam de meus demônios.
            Desci na estação Ecole Militaire, a alguns quarteirões de distância da torre, pois queria caminhar um pouco e sentir o ar francês antes de chegar ao meu destino.
            Apesar do céu limpo, aquele dia estava particularmente frio, e mesmo que eu estivesse vestindo um grosso casaco, ainda não era suficiente para aquela temperatura e aquele vento.
            Ao começar a subir as escadas que levavam à rua, um misto de emoção e frio tomou conta do meu corpo e eu tremi. A sensação de que ao colocar os pés na superfície eu teria um vislumbre da magnífica torre só me fazia tremer mais.
            Quando finalmente cheguei ao nível da rua, alcei a vista e... nada. Eu não podia ver a torre em canto algum. Eu sabia que a estação não ficava tão perto dela, mas eu estava certo de que era possível vê-la dali.
            Vi o prédio da escola militar mais adiante e caminhei até lá. Ao chegar em frente ao prédio, olhei para o lado e, como se emoldurado pelo mur de la paix, estava a imponente torre. Sentei-me nos degraus daquele monumento à paz e, durante algum tempo, esqueci o frio e qualquer outro problema que me afligia. Naquele momento, a torre era minha guardiã. O champ-de-mars se estendia como um tapete verde que conectava minha guardiã metálica em uma ponta, a mim, na outra. Durante os minutos que passei ali – que podem ter sido cinco ou cinqüenta – o mundo pareceu parar, e meus problemas pareciam pequenos.
            Atravessei o campo e, apesar do frio extremo, subi o monumento. Ao chegar no topo, pude ter uma visão geral de toda a cidade. Ao perceber, ao longe, o arco do triunfo, fechei um olho e estendi o polegar até cobri-lo completamente. Então abri a mão e cobri metade da cidade. Nesse momento, citando mal algum filme antigo, eu disse baixinho:
            - Paris é minha!

La Vie En Rose (Capítulo 1)



Hades


Trinta e três semanas e dois dias. Foi exatamente o tempo que durou meu relacionamento com Bianca. Um misto de paixão e fúria que consumiu todas as minhas energias. Me fez passar de um apaixonado sonhador, a um fantasma que caminha sem rumo por ruas mal iluminadas, se esgueirando pelos cantos. Uma aberração. Sem sentimentos e sem emoções. Pois tudo que um dia senti, foi consumido pelo assombro cruel e sem vida de uma pessoa sem compaixão, a quem um dia amei.

Trinta e três semana e dois dias, foi o tempo exato da viagem que me levou do paraíso às profundezas do Hades.
Tentei continuar com a vida: amigos, trabalho, família… mas apenas os decepcionei. Enquanto todos tentavam me dar apoio, me aconselhar, apenas os feria, como uma fera acuada diante da mão que a tenta alimentar, decepando-a violentamente, sem se dar conta de seu engano, mas apenas tentando se proteger, em seu medo cego de ser ferida novamente, mesmo que não tenha sido o agressor, aquele que agora dá alimento. Apenas afastava de mim aqueles que ainda eram sinceros comigo enquanto tornava-me apenas a sombra do homem que um dia fui. A sombra de um homem brilhante, criativo e amável, agora amargurado e excluso.
A morte foi uma opção, mas ainda não, primeiro, precisava ter certeza de que havia ao menos uma saída para a situação nefasta em que encontrava, e no fundo eu sabia que havia. Sempre tive convicção de que a luz da esperança não se apaga, por mais densa e palpável que seja a escuridão que a envolve. Algumas pessoas apenas não a vê, por estarem cegas demais para contemplar, mesmo o ínfimo brilho; ou por estarem olhando para a direção errada.
Eu ainda não havia enxergado a luz, mas sabia que se continuasse procurando a encontraria em algum lugar. Foi quando comecei a minha busca…