O Céu de Ícaro

Porque o céu de Ícaro tem mais poesia que o de Galileu

A foto

O vento soprava não muito forte no calçadão de Copacabana, mas o suficiente para que ele tivesse que segurar a foto com firmeza para que ela não voasse. Aquela foto dela era uma das imagens mais lindas que ele já havia visto. Ele viajara o mundo, conhecera Petra, Bali, Malta, as Grandes Pirâmides, mas nada era tão sublime quanto aquela foto dela. Ah, aqueles cabelos ao vento, seu sorriso descontraído, seu vestido branco voando com leveza, seus olhos quase fechados, mas ainda assim podia-se ver o brilho resplandecente que saía daquelas jóias azuis. Os raios de sol refletidos em seus cabelos davam a Ela uma aura angelical.
Ela havia deixado a foto cair naquele mesmo calçadão, ele a encontrou, mas não a contou, decidiu mantê-la para si, para que aquela imagem o confortasse em dias ruins, dias esses que eram constantes. Bebidas já não eram suficientes para esconder a sua dor, mas a foto... ah, a foto... ela era o antídoto para todo o seu mal. Afogava-se nas ondas do cabelo dela, cegava-se com o brilho de seu sorriso e, apenas de pensar em sua voz, ficava surdo para o mundo, e para o mundo, tornava-se um inválido, mas para si, tornava-se completo.
Aquela foto tinha sobre ele um efeito hipnótico, entorpecente. Quando estava com ela, o mundo era mais claro, mais colorido, mais... Ela.
Como pode uma fotografia ter um efeito tão poderoso sobre alguém? Ele não sabia, e também não se importava, apenas queria ficar ali, admirando-a.
O vento soprou mais forte, a foto quase voou de sua mão, e então ele sentiu aquele perfume doce que já conhecia bem, um perfume suave que bagunçava seus sentidos, fazendo-o sair por alguns instantes de nosso plano físico e se transportar para um lugar que não sabia explicar bem onde ou como era, mas que era o melhor local onde já estivera. Sim, o vento, ciumento, tentou tirar-lhe a foto, mas como recompensa por sua traquinagem, trouxe o perfume dela. Quando o efeito anestesiante do perfume passou, todos os seus sentidos voltaram como um turbilhão sinestésico: sua língua jurava sentir o gosto dela, suas narinas tentaram capturar um pouco mais daquele perfume, seus ouvidos foram inundados pelo som de sua voz, ele se arrepiou e virou o rosto para vê-la. Sim, ela estava ali, em pessoa, não era mais uma imagem estática. Ele virou a foto e escondeu-a com a mão sobre a coxa.
Ela passou por ele com seu ar gracioso, parecia que estava sempre a caminhar sobre as nuvens. Sua presença foi suficiente para fazê-lo congelar no lugar, como se tivesse trocado de lugar com a foto; ele agora era uma imagem estática enquanto Ela... Ela deslizava no ar.
Ela passou, mas não notou sua presença, nunca notara.
Ah, se um dia ele tivesse coragem de se apresentar...